O Livro que Mudou o Meio Ambiente, artigo de Wellington Barros sobre a obra A Primavera Silenciosa

Um Livro que Mudou o Meio Ambiente

  • Por:WBA

Na pesquisa para o meu CURSO SISTEMATIZADO DE DIREITO AMBIENTAL (em vias de publicação) levantei a importância de um livro que mudou o conceito de meio ambiente.

Em 1962, o DDT (dicloro difenil tricloroetano) era conhecido como um produto de efeitos benéficos inquestionáveis. Tinha uma verdade científica incontestada. O veredicto de um produto de mil e uma utilidades surgiu quando, em 1940, Paul Hermann Mueller, da companhia suíça GEIGY PHARMACEUTICAL, observou que o DDT sintetizado por Zeidler em 1874, era um potente inseticida e que ainda tinha como aliado a baixa solubilidade em água, alta persistência e que propiciava resultados verdadeiramente notáveis fazendo com que seu uso rapidamente se expandisse. Esse fato deu a Paul Mueller o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina, em 1948. Conta-se que durante a Segunda Guerra Mundial, na Itália, o DDT em pó foi pulverizado na pele das pessoas para prevenir epidemias de tifo transmitidas por piolhos, que causavam alta mortalidade. Foi também usado, em grandes áreas do globo terrestre para eliminar os mosquitos que transmitiam malária. Mais tarde, o DDT foi utilizado no controle de pragas na agricultura, particularmente em colheitas com elevado rendimento econômico. O Rio Grande do Sul sentiu o seu poder.

Neste contexto, RACHEL LOUISE CARSON, escritora, cientista e ecologista norte-americana, publicou o livro A PRIMAVERA SILENCIOSA (Silent Spring) mostrando, na contramão dos fatos, que o DDT penetrava na cadeia alimentar e se acumulava nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem, afirmando que já tinha sido detectado a sua presença até no leite humano, com a possibilidade de causar câncer e dano genético. A escritora, com impacto, mostrou que uma única aplicação de DDT em uma lavoura matava insetos durante semanas e meses e, não só atingia as pragas, mais um número incontável de outras espécies, permanecendo tóxico no ambiente mesmo com sua diluição pela chuva. No ser humano causada cloro-acnes, na pele, e sintomas inespecíficos, como dor de cabeça, tonturas, convulsões, insuficiência respiratória e até morte, dependendo da dose e do tempo de exposição.

O livro era provocativo porque além de expor os perigos do DDT, também questionava a confiança cega da humanidade no progresso tecnológico e por isso causou alarme entre os leitores americanos, provocando a indignação da indústria de pesticidas e reações extremadas que, inclusive, questionaram a sua integridade e sanidade. Respondendo às acusações a autora demonstrou evidências fortes do malefício do DDT, tanto que cientistas eminentes vieram em sua defesa, o que levou o Presidente John Kennedy a ordenar ao comitê científico de seu governo que investigasse as questões levantadas pelo livro. Os relatórios apresentados foram favoráveis ao livro e à autora. Como resultado, o governo passou a supervisionar o uso do DDT que terminou sendo banido.

Fato interessante é que a idéia de escrever o livro não foi algo imediato, mas a saída encontrada pela ambientalista para tornar pública sua luta contra os ataques ao meio ambiente. Inicialmente ela escreveu um artigo para a revista Reader’s Digest falando sobre a série de testes que estavam sendo feitos com o DDT próximo a onde ela vivia, em Maryland, nos EUA. Sua matéria foi rejeitada. Treze anos mais tarde, em 1958, a idéia de RACHEL de escrever sobre os perigos do DDT, teve um novo alento, quando ela soube da grande mortandade de pássaros em Cape Cod, causada pelas pulverizações de DDT, mas a autora não conseguiu convencer nenhuma revista a publicar sua opinião sobre os efeitos adversos do DDT, apesar de ser ela uma pesquisadora e escritora reconhecida. Sua visão sobre o assunto soava como uma heresia. Batalhadora, ela decidiu abordar o assunto em um livro.

A maior contribuição de A PRIMAVERA SILENCIOSA foi à conscientização pública de que a natureza é vulnerável à intervenção humana. Poucas pessoas até então se preocupavam com problemas de conservação: e a maior parte pouco se importava se algumas ou muitas espécies estavam sendo extintas. Mas o alerta de RACHEL CARSON era assustador demais para ser ignorado porque isso envolvia a contaminação de alimentos, os riscos de câncer, de alteração genética e a morte de espécies inteiras. Pela primeira vez, a necessidade de regulamentar a produção industrial de modo a proteger o meio ambiente se tornou aceita.

A PRIMAVERA SILENCIOSA é o livro que valeu mais do que uma guerra na luta contra o desenvolvimentismo industrial sem peias e causador de danos ambientais imensos, pois criou uma consciência sobre a necessidade de imposição de legislação mais rígida e protetiva sobre o meio ambiente.

O livro foi o despertar de uma consciência ecológica, tema até então tabu ou coisa de louco.

Aliás, o Rio Grande do Sul e o Brasil devem muito à figura de um louco desse gênero o engenheiro agrônomo e ambientalista JOSÉ ANTÔNIO LUTZENBERGER que, entre tantas ações a favor do meio ambiente, se projetou internacionalmente pela ferrenha luta que travou contra a poluição emanada da indústria norueguesa de celulose Borregard localizada às margens do Guaíba, no Município de Guaíba, grande Porto Alegre, que, com os seus gases exalando fedor de coisa podre inundava a capital gaúcha quando soprava o vento oeste. A indústria chegou a ser fechada entre 07 de abril de 1972 a 13 de março de 1974 e borregard passou a ser sinônimo de poluição. Hoje, depois de sofrer várias sanções administrativas a antiga Borregard mantém níveis de proteção ambiental exemplares quer quanto aos seus efluentes industriais quer quanto à emanação de seus gases na atmosfera que, embora continuem varando o espaço, como sempre fizeram, se constituem apenas de elemento ondulante a integrar a paisagem que ganhou foro de cartão postal de Porto Alegre, especialmente se observada com o espetáculo do pôr do sol.

*Artigo publicado originalmente em 15/02/2008.


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Wellington Pacheco Barros, OAB/RS Nº 6.103
Professor de pós-graduação e desembargador aposentado do TJ/RS, advogado e autor de obras jurídicas.

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