
Prescrição Intercorrente da Cédula Rural Pignoratícia
11 de dezembro de 2024O ano de 2025 inicia com um grande desafio ao produtor rural gaúcho: a gestão financeira da propriedade. Em 2024, testemunhamos o colapso do endividamento do agricultor, somando estiagens desde 2019 e, mais recentemente, um ano marcado por excesso de chuvas e enchentes. Esse cenário acumulado levou o produtor às ruas, de maneira democrática e exemplar, em busca de soluções do Governo Federal, que tinha a obrigação de oferecer uma linha de crédito que aliviasse o endividamento.
Os dados da Emater-RS indicam que 206.604 propriedades foram atingidas, enquanto as estimativas da Farsul apontam que o agronegócio gaúcho registrou prejuízos de cerca de R$ 4 bilhões, com a recuperação do setor prevista para levar pelo menos uma década.
Acompanhamos ansiosos medida por medida que prometia um respiro financeiro, ao menos para amenizar imediatamente os prejuízos causados pelas enchentes. A mencionada Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul mapeou que, após as enchentes, foram realizados 166.396 contratos com instituições financeiras, no valor de R$ 24,5 bilhões, porém cerca de 38 mil agricultores realizaram renegociações à juros de mercado, somando um montante de R$ 6 bilhões.
Vale ressaltar que nem todos os produtores conseguiram alongar ou renegociar seus contratos. Para aqueles que o fizeram, infelizmente, as medidas foram apenas paliativas, pois o valor da obrigação não congela no tempo. Os juros continuam a correr, aumentando o saldo devedor.
Falando em juros, analistas projetam uma taxa básica de juros (Selic) em 15% (quinze por cento) para 2025. Portanto, contratos de crédito rural atrelados a taxas variáveis, como o CDI, também serão impactados. Renegociações que ajustem a taxa variável (por exemplo, CDI + 3,5%) para uma taxa fixa (por exemplo, 16%) ainda podem ser um bom negócio diante de um cenário desfavorável.
Culturalmente, o brasileiro não tem o hábito de se planejar financeiramente a longo prazo. Uma evidência clara disso é a prática de tomar crédito para financiar a safra, ao invés de utilizar financiamentos apenas para investimentos pontuais. Contudo, o produtor que não se organizar certamente sofrerá prejuízos ainda maiores.
Nesse contexto, destaca-se a execução de garantias em caso de inadimplemento, como a alienação fiduciária de área rural. Embora esse instrumento ofereça ao credor maior segurança na concessão de crédito, ele pode ser extremamente prejudicial ao produtor que enfrenta dificuldades de pagamento. O procedimento é extrajudicial e muito rápido, e, em questão de semanas, a propriedade pode ser consolidada e levada a leilão. Nosso escritório questiona esse procedimento, uma vez que a lei da alienação fiduciária, criada como política pública para acesso ao primeiro imóvel, é mais adequada para imóveis urbanos. No caso de imóveis rurais, o processo desconsidera a proteção constitucional da função social da propriedade produtiva e da segurança alimentar. O Judiciário, muitas vezes distante da realidade do campo, tem favorecido os credores ao analisar a matéria.
Diante desse cenário, compartilhamos algumas dicas práticas para ajudar o produtor a superar o endividamento:
1. Realize um planejamento financeiro do ano-safra
Existem inúmeras soluções que auxiliam nesse planejamento, incluindo consultores financeiros, profissionais de contabilidade e advogados especializados no agronegócio. Também há ferramentas tecnológicas eficazes que ajudam na elaboração de planos financeiros. Se preferir, comece pelo básico: liste todos os custos da safra, desde insumos até a manutenção de maquinário; estime receitas de forma realista, considerando riscos climáticos e de mercado; monitore mensalmente o fluxo de caixa e revise projeções conforme necessário.
2. Diversificação das fontes de renda
Contar apenas com uma cultura ou um único cliente aumenta o risco em casos de perda de safra. Avalie a viabilidade de remodelar a forma de produção, produzir culturas complementares e considere atividades não agrícolas, como turismo rural e energia solar.
3. Faça uma revisão periódica dos contratos de crédito
Os contratos podem conter cláusulas abusivas ou se tornarem desfavoráveis com o tempo. É fundamental entender tributos, encargos, prazos e garantias envolvidos. Solicitar a revisão jurídica dos contratos e renegociar podem ser boas ferramentas se for necessário, com base no histórico de adimplência.
4. Evite tomar crédito sem análise de viabilidade
Créditos mal planejados podem transformar-se em um ciclo de endividamento. Antes de contratar um empréstimo, projete como será o pagamento e avalie se a dívida caberá no fluxo de caixa, mesmo em cenários adversos.
5. Mantenha uma reserva de emergência
Como visto, eventos climáticos e oscilações de mercado são frequentes. Ter um fundo de reserva ajuda a enfrentar crises e pode ser um diferencial em renegociações. Destine parte das receitas para essa conta e utilize o fundo exclusivamente em emergências, como perdas de safra.
6. Proteja-se com Seguro Rural
O Seguro Rural, ou Seguro Agrícola, adequadamente contratado para os riscos climáticos da região da propriedade, é essencial para casos de perda de produção. Siga todas as recomendações agronômicas e documente o desenvolvimento da lavoura. Em caso de negativa de pagamento por parte da seguradora, é possível buscar a cobrança judicialmente.
7. Evite garantir dívidas pessoais com a propriedade rural
Muitas famílias perdem suas propriedades ao misturar finanças pessoais com as do negócio. Separe as contas pessoais das contas da fazenda e evite utilizar o imóvel rural como garantia em operações pessoais.
8. Invista em gestão tecnológica e consultoria especializada
Ferramentas digitais e apoio técnico especializado ajudam a tomar decisões financeiras com mais segurança. Softwares de gestão rural e consultorias financeiras e jurídicas podem auxiliar na avaliação de oportunidades e riscos.
9. Cultive uma cultura de educação financeira no campo
A falta de conhecimento sobre finanças é uma das principais causas de endividamento. Falar sobre dinheiro e profissionalizar os negócios no campo melhora a gestão dos recursos. Participar de cursos e eventos sobre gestão financeira rural, compartilhar conhecimento com a equipe e a família, e contar com profissionais de confiança auxilia nas decisões.
Torcemos que os desafios postos neste início de ano sejam superados com a força e a bravura do produtor rural gaúcho. Contar com ajuda no planejamento financeiro facilita a execução da produção e a organização da propriedade.
Conte com especialistas no assunto.

Paula Nicolay
ÁREAS DE ATUAÇÃO
Empresarial no Agro • Sucessão e Organização Familiar • Startups • inovações no Agronegócio