CLÁUSULA QUE FIXA O PREÇO DO ARRENDAMENTO RURAL DEVE SER EM DINHEIRO

Cláusula que fixa o preço do arrendamento rural deve ser em dinheiro

  • Por:WBA

Saber as peculiaridades de cada tipo de contrato é essencial no momento da escolha de qual o melhor para a avença agrária. Por vezes, algumas exigências legais não são respeitadas. Exemplo disso diz respeito à cláusula do preço no arrendamento agrário. O art. 18 do Decreto n. 59.566/1966 é categórico ao afirmar que “o preço do arrendamento só pode ser ajustado em quantia fixa de dinheiro”.

Enquanto que, no contrato de arrendamento, o arrendatário paga valor fixo em dinheiro ao arrendador, no de parceria há partilha dos frutos, investimentos, produtos e lucros, em uma quota estabelecida pela lei.
Em muitas ocasiões, em razão dos costumes locais, os contratantes fixam o preço em produto, ao contrário do que diz o texto legal. Ocorre que o direito agrário é um ramo que sofre forte intervenção estatal. A legislação agrária foi criada com o intuito de equilibrar os desequilíbrios que advinham do campo, sobretudo, com relação ao dono da terra e de quem nela trabalha.

Talvez porque essa relação tenha sofrido alterações durante décadas, já que a realidade econômica e social do campo é outra, bem como em respeito aos costumes locais, é que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tem entendimento pacificado no sentido de aceitar a fixação do preço do contrato de arrendamento rural em produtos, como demonstra o seguinte julgado:

CONTRATOS AGRÁRIOS. AÇÃO DE COBRANÇA. REGULARIDADE DA FIXAÇÃO DO PREÇO DO ARRENDAMENTO EM PRODUTO. Sentença que decide de acordo com os limites impostos na lide, com adequada justificativa das suas conclusões, não padece de vício de nulidade. Não é de ser declarada inválida cláusula de contrato de arrendamento rural que estabelece o preço pelo uso da terra em quantia de produto. Rigorismo da lei que deve ser abrandado, em especial diante dos usos e costumes da região. É de se afastar tese de defesa com base na ilegalidade da cláusula na avença. Princípio da boa-fé contratual. Inexistência de qualquer comprovação de prejuízo pela forma de fixação do preço do arrendamento. (…) (Apelação Cível Nº 70061595484, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 25/06/2015)

Entretanto, diferentemente da Corte Gaúcha, o Superior Tribunal de Justiça, última instância para dirimir questões de direito federal, tem entendimento sedimentado de que é nula a cláusula que fixa o preço do arrendamento rural em produtos, abrandando apenas que essa nulidade não obsta que o credor proponha ação visando à cobrança de dívida por descumprimento do contrato:

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À AÇÃO MONITORIA. CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL. FIXAÇÃO DE PREÇO. CLÁUSULA. NULIDADE. PROVA ESCRITA. INSTRUÇÃO DO FEITO. POSSIBILIDADE.
1. Discute-se nos autos se contrato de arrendamento rural em que se estipulou o pagamento da dívida mediante entrega de produtos agrícolas serve como “prova escrita sem eficácia de título executivo”, hábil a amparar propositura de ação monitória.
2. A teor do disposto no artigo 1.102-A do Código de Processo Civil, a prova escrita capaz de respaldar a demanda monitória deve apresentar elementos indiciários da materialização de uma dívida decorrente de uma obrigação de pagar ou de entregar coisa fungível ou bem móvel.
3. É nula cláusula contratual que fixa o preço do arrendamento rural em frutos ou produtos ou seu equivalente em dinheiro, nos termos do art. 18, parágrafo único, do Decreto nº 59.566/1966. Essa nulidade não obsta que o credor proponha ação de cobrança, caso em que o valor devido deve ser apurado, por arbitramento, em liquidação. Precedentes.
4. O contrato de arrendamento rural que estabelece pagamento em quantidade de produtos pode ser usado como prova escrita para aparelhar ação monitória com a finalidade de determinar a entrega de coisa fungível, porquanto é indício da relação jurídica material subjacente.
5. A interpretação especial que deve ser conferida às cláusulas de contratos agrários não pode servir de guarida para a prática de condutas repudiadas pelo ordenamento jurídico, de modo a impedir, por exemplo, que o credor exija o que lhe é devido por inquestionável descumprimento do contrato. 6. Recurso especial não provido. (Resp 1266975/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 28/03/2016)

Em razão desse posicionamento, é importante os contratantes respeitaram o comando legal, mesmo que os costumes locais indiquem para outro lado, já que eventual questionamento judicial de um dos contratantes prejudicados pode acarretar a nulidade da cláusula.

 


wellington pacheco barros advogado
Wellington Pacheco Barros, OAB/RS Nº 6.103
Professor de pós-graduação e desembargador aposentado do TJ/RS, advogado e autor de obras jurídicas.

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